sexta-feira, 11 de abril de 2008

Mulheres no funk: vítimas ou heroínas?


por Silvia Barros




Entre os anos 80 e 90 ficamos conhecendo uma nova forma de expressão musical no Brasil. Ainda com influência da música norte-americana, com bases prontas em que se colocavam letras de amor, de afirmação cultural ou irreverentes, o funk se desenvolvia no Rio de Janeiro.

Nos anos 2000 ocorre uma inovação que coloca o “funk carioca” nos “playlists” de descolados mundo a fora. O funk incorpora a batida do atabaque do candomblé ao eletrônico e consolida sua identidade com o som do “tamborzão”. Junto com essa renovação há uma outra novidade, sutil, mas arrebatadora: a entrada das mulheres cantando e compondo funk. Se antes elas estavam apenas atrás dos MC’s dançando coreografias sensuais, agora elas empunham o microfone cantando letras bem mais que sensuais.

A performance altamente erotizada das dançarinas agora é voz. Ela diz: “Eu vou pro baile sem calcinha”, “tá ardendo, tá arranhando, eu tô agüentando” enquanto outras dançam lotando os salões de casas noturnas da classe média, as quadras dos bailes de morros e comunidades, principalmente depois da abertura da televisão para as funkeiras que hoje são “celebridades”.
É claro que já havia mulheres MC’s, algumas de grande sucesso, porém não com tamanha visibilidade. Tínhamos Willian e Duda, Cidinho e Doca, Claudinho e Buchecha, MC Marcinho, mas nenhuma menina tão famosa quanto eles. Hoje, nas seqüências das rádios e palcos vemos Os Hawaianos, Juliana e as fogosas, Os Magrinhos, Gaiola das Popozudas, Deise Tigrona com suas letras e coreografias reproduzidas por crianças, adolescentes e adultos.

A mudança de estilo na batida e nas próprias letras dos funks propiciou essa nova atitude. As composições românticas com letras extensas e melódicas deram lugar às repetições quase minimalistas de frases ou palavras incitadoras, ao mesmo tempo em que os vínculos nas relações amorosas e sexuais também iam mudando.

A mulher que canta e dança o funk atual é a mesma que está inserida no contexto da “pegação” diária, da valorização das formas femininas por meio de micro shorts e saias que levantam ao ritmo da dança.

Longe de tentar reproduzir um discurso moralista, percebo uma trajetória que nos leva à ambígua situação das mulheres contemporaneamente. Nós conseguimos maior visibilidade, inserção em diversos locais sociais antes totalmente fechados às mulheres, conquistamos liberdade sexual, o direito de escolhermos nossos parceiros ou parceiras sexuais/afetivos. E continuamos conquistando...

Um lugar mais nobre no palco, o estilo de canto gritado, a possibilidade de falar o que e como queremos. O grupo Gaiola das Popozudas canta “Eu vou pro baile sem calcinha, agora eu sou piranha e ninguém vai me segurar!”. A explosão de expressão física e verbal de sexualidade parece esconder uma outra forma de dominação sobre as mulheres.

Os Hawaianos dizem: “Mina cheia de marra de bam se eu te pego eu te escangalho, na hora do prazer sou eu que faço o trabalho” reafirmando seu poder masculino enquanto elas, para se mostrarem livres dessa dominação querem decidir quando e com quem vão fazer sexo. Contudo nós vemos que essa sexualidade compulsória é também uma troca de posições, já que eles não as possuem forçosamente, mas elas (se) dão, realizando seus fetiches.

O nome Gaiola das Popozudas é um exemplo da necessidade de exibição, estão expostas entre grades para serem vistas, consumidas. Deise “tigrona” incorporou a seu nome o apelido de animal sensual, embora sua postura e aparência nem sejam compatíveis com esse estereótipo. Talvez Deise nem mesmo se sinta uma tigrona, ou uma tigresa, mas aprendeu que há uma necessidade de mercado que a impede de ser somente MC Deise (como ela se apresentava anos atrás). Deise também é a autora do funk “Injeção”, outro exemplo do recurso de fetiche, com a brincadeira de médico, e o sadomasoquismo:

Quando eu vou ao médico
Sinto uma dor
Quer me dar injeção
Olha o papo do Dr.:
Injeção dói quando fura,
Arranha quando entra
Doutor, assim não dá,
Minha poupança não agüenta!
Tá ardendo,mas tô agüentando,
Arranhando,mas tô agüentando
Tá ardendo eu tô agüentando!
Arranhando, eu tô agüentando!

Percebemos, assim, que as possibilidades abertas às mulheres no meio funk as levam ao uso de seus corpos como atrativos. O erotismo dá o mote do apelo ao consumo. Seus corpos estão disponíveis em dvds piratas e originais, no youtube, e em quantos mais veículos de mídia puderem estar. É claro que essas moças não são vítimas indefesas nem estão presas a um “destino de mulher objeto”, mas sentindo-se heroínas da favela não percebem quem muitas vezes são ridicularizadas ganhando apelidos como a “mulher melancia” (do grupo do MC Créu) que em foto para capa revista (publicação comum sobre novelas e famosos) posava de costas com as mãos nos joelhos vestindo um shortinho apertado.

14 comentários:

Ivan disse...

Faria apenas uma ou outra consideração. Durante os anos 1990, havia a Mc Cacau, que chegou a fazer um relativo sucesso (talvez em função do casamento - intermediado pelo funk, por isso sim - com o Mc Marcinho...).
E atualmente há um grande número de funks "melódicos", se é que cabe o rótulo. Ao lado dos funks "minimalistas" existem outros com homens e mulheres (com predomínio dos primeiros) cantando letras um pouco mais extensas etc. Mc Sabrina, que tinha ficado conhecida pelo funk do primeiro tipo, agora também ataca por essas áreas.

Sinceramente, é um assunto que estou longe de ter uma opinião formada. Imagino, como o seu texto indica, que não seja possível afirmar que as mulheres do funk sejam ou vítimas ou heroínas. As duas coisas talvez? Ou quem sabe um terceiro caminho: apenas pessoas que estão tentando se encontrar na vida - o que não em muitos casos não é necessariamente um ato de heroísmo, por exemplo...
Beijos.

Silvia Barros disse...

Vc tem razão Ivan, na verdade eu fiz só um panorama geral, o estilo de funk melódico contiua, inclusive os artistas como Marcinho, Bob Run, etc continuam tendo seu espaço.

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