sexta-feira, 25 de abril de 2008

40 anos de 1968: síntese de debate do grupo de estudos do OICult


por Pedro Henrique Nunes e Silvia Oliveira (Observatório da Indústria Cultural/UFF)



No último encontro do Observatório da indústria cultural, realizado no dia 13 de março, discutimos dois textos de Marcelo Ridenti: “Intelectuais, estudantes e artistas: Paris, 1968”[1] e “Breve recapitulação de 1968 no Brasil”[2], e um de Iná Camargo Costa: “Teatro e revolução nos anos 60”[3]. Esta é uma tentativa de síntese do que foi apresentado e debatido, a partir dos textos, nessa ocasião.


No primeiro texto, Marcelo Ridenti[4] apresenta um breve resumo dos acontecimentos mais marcantes do ano de 1968 na França e comenta uma extensa bibliografia que trata do assunto. O artigo é resultado de um estágio realizado pelo autor em Paris, na École dês Hautes Études em Sciences Sociales, no início do ano 2000.


O ano de 1968 foi de muita agitação política em todo o mundo. Na França, foi marcado por uma ampla e radicalizada mobilização política, que contou com ocupação de várias universidades, de fábricas e até do tradicional Teatro Odéon, greve em diversos setores e forte repressão policial. De acordo com Ridenti, o movimento francês de 1968 ‘inaugurou novo estilo de ação e manifestação, fora de partidos ou sindicatos, recusando qualquer tipo de tutela política’. Ele diz que todo esse movimento não tinha uma proposta concreta de organização política e que, naquele momento, ‘tratava-se mais de negar os valores e a ordem estabelecida do que propor qualquer alternativa concreta’. Misturavam-se os propósitos, que variavam desde o desejo de melhorias salariais e trabalhistas até as propostas anticapitalistas.


O segundo texto, também de Ridenti, trata da mobilização contra a ditadura no Brasil. Segundo o autor, “o 1968 brasileiro integrou a onda de revolta mundial, mas não deve ser compreendido fora do contexto específico nacional”. Aqui em nosso país, esse ano foi marcado também por ocupações de universidades, greve de operários em Contagem (MG) e Osasco (SP) e manifestações na rua contra a censura (como a Passeata dos cem mil). Em dezembro, o governo baixou o Ato Institucional nº 5. A partir de então, inúmeros estudantes, intelectuais, políticos, artistas foram presos, cassados, torturados, mortos ou forçados ao exílio.


Os textos de Ridenti se limitam a resumos de fatos marcantes do ano de 1968 na França e no Brasil, não aprofundam, nem problematizam nenhuma questão específica. Desse modo, nosso debate ganhou mais fôlego com o terceiro texto, a partir de alguns aspectos apontados por Iná Canargo Costa[5].


O ensaio de Iná, publicado pela primeira vez em 1996, traz uma análise sobre os caminhos seguidos pelo teatro engajado no Brasil nos anos 1960. Além do mais, recupera um debate que era feito no meio teatral nos anos 1960.


A autora problematiza a apropriação de Bertolt Brecht no teatro brasileiro, ao mesmo tempo em que tenta identificar o teatro verdadeiramente revolucionário. Ela deixa claro que o movimento que mais se aproximou de uma luta mais relevante foi aquele que teve na obra de Brecht uma utilização mais fiel, com a busca de outros espaços e outras platéias que pudessem dialogar com a obra do dramaturgo alemão de maneira mais ativa.


Entretanto, Iná Camargo não vai direto ao ponto e procura traçar um panorama do que foi o teatro da década de 60 no Brasil, identificando historicamente o início de uma tomada de consciência que chegou a um ápice do teatro transformador e depois decaiu em uma espécie de capitulação após o golpe militar.


Para ela a década de 60 começa em 1958 e termina em 1968. De início as montagens do Teatro de Arena foram as responsáveis por um olhar diferente das questões referentes aos assuntos tratados em cena. Eles não usam back-tie, que estreou exatamente em 1958 é uma montagem emblemática, no sentido em que trata de problemas que não se limitam à esfera do privado, ainda que de forma um pouco tímida, fazendo menções apenas, não sendo a questão pública o foco principal da cena.


Depois a autora discute as investidas de Augusto Boal, num processo crescente de radicalização em que pela primeira vez se teve a experiência do Teatro Épico, com a montagem de Revolução na América do Sul.


Para Iná Camargo, a verdadeira Revolução do Teatro Brasileiro vai acontecer com Oduvaldo Viana Filho, quando ele se desvincula do Teatro de Arena e funda com outros militantes o CPC. Ela chega a afirmar que as criações do CPC, de acordo com a estrutura de trabalho e engajamento, propiciaram uma Revolução Teatral nos moldes das que ocorreram na União Soviética e Alemanha.


Entretanto, após o golpe de 1964, que pôs os militares no poder, estabelecendo no Brasil uma ditadura, toda a sociedade teve de reagir, por vezes se adaptando à nova realidade. Com o teatro não foi diferente, iniciando uma era de autocrítica por parte de muitos que antes haviam chegado longe, em termos de possibilidades de transformações reais da sociedade através da arte. O show Opinião, por exemplo, configura-se como o primeiro passo atrás. Depois seguiram as experiências retrógradas do Teatro de Arena, com o Arena conta Zumbi e Arena conta Tiradentes. Para a autora, tais espetáculos dissolvem questões cruciais do Teatro Épico, deixando os protagonistas numa situação heróica que não condiz com a necessidade de distanciamento de Brecht. Isso fica bastante evidente em Tiradentes.


Por último, as experiências do Teatro Oficina seriam, segundo Iná Camargo, uma grande derrocada do Teatro Revolucionário, principalmente com Roda Viva que teria se enquadrado na lógica da Indústria Cultural, embora o próprio texto faça a crítica disso. O Teatro Épico é utilizado, mas sendo completamente desconfigurado, caracterizando o início de um uso meramente estético, pouco importando as funções que traduzem uma intervenção política mais concreta. Estamos agora em 1968, ano do AI-5, fim da década Revolucionária do Teatro Brasileiro.


[1] RIDENTI, M. S. “Intelectuais, artistas e estudantes: Paris, 1968”. In: Reis Filho, Daniel Aarão. (Org.). Intelectuais, história e política (séculos XIX e XX). Rio de Janeiro: 7 Letras, 2000, p.p. 247-270.
[2] RIDENTI, M. S. “Breve recapitulação de 1968 no Brasil”. In: Garcia, Marco Aurélio. (Org.). Rebeldes e contestadores - 1968: Brasil, França, Alemanha. SP: F. Perseu Abramo, 1998, p.p. 55-60.
[3] COSTA, I. C. “Teatro e revolução nos anos 60”. In: Sinta o drama. 1. ed. SP: Vozes, 1998, p.p. 183-191.
[4] Professor de sociologia na Unicamp.
[5] Professora do Departamento de Teoria Literária da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP.

3 comentários:

Carlos Leen Santiago disse...

muito bom.....

Carlos Leen Santiago disse...

muito bom.....

phaby disse...

gostei desse assunto é um assunto social e historico